Passavam gaivotas sobrevoando o ar gelado, era ventoso o dia, na janela o céu nublado, parei a ler antigos contos, de uma época em que meus sentimentos eram íntegros a apenas uma pessoa, parei-me a ler sobre um espetáculo do passado, onde o palhaço subia no trapézio e pulava em um balde com água. O palhaço era eu, mas como é interessante o amor, não me arrependo de um namoro, de um beijo, muito menos de uma carta ou um presente, mas arrependo-me de não ter pulado mais fundo, mais alto, por que minha vida se pronuncia na intensidade, como posso pensar em fazer alguém rir, pensando no que poderá dar errado?
Deparo-me com um muro cinza e com vidros para proteger o salto de algum ladrão, a invasão o roubo, eu imagino meu coração, sendo cercado por ele, como encarar os medos, se não proteger com muralhas, o quanto mais difícil for a invasão, mais fácil é a proteção, mas proteção do que?
No meu quarto as grades, a janela aberta, o ar entra, arejando a peça, parado cá estou escrevendo, deitado na cama, protegido, das pessoas lá fora, vem a noite, relâmpagos no céu que antes era cinza, agora é negro como os cabelos da minha ultima amada, o ultimo beijo, úmido e quente como esse cobertor a me esquentar, mas não era para ela quem enderecei os contos de interminável amor, e como isso é possível, jurar amor a mais de uma mulher, será que eu sei o que é amor, será que eu sei o que é amar, será que eu sei o que é viver...
Pensa como o Dom Quixote, vivia sua fantasia, a busca de Dulcineia, perseguiu gigantes e dragões, e viveu intensamente seus delírios, será assim o desafio do amor, sonhar acordado, olhar os pássaros, ler o passado e suspirar com o futuro, mas e os muros, como posso permitir alguém entrar novamente, como posso permitir alguém invadir meu castelo?
Vem o dia, e volto a escrever, bom dia, boa tarde, boa noite... que a luz não bate na janela, e minha cara ainda amassada e sonolenta, não vê o áspero e gelado toque da água, mesma que cai lá fora, e aqui dentro me escondo de todas as quedas...
acordei meio que poeta, meio que bêbado de bar, meio que prosador de rimas pobres, meio que mendigo de vila rica...
São os meus delírios, é a minha vida, só conhecem ela as gaivotas que migram para os pólos, o vento que entra na janela, como varias vezes entrou o amor.